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Giorgio Morandi

 

"AGALOPADO" E OUTROS POEMAS DE ANTÔNIO CARLOS BARRETO

 

 

AGALOPADO

 

Sou mais que as manadas ao som do chocalho,

esteira de prata nas larvas de fogo,

transtorno de outono buscando agasalho:

espadas, mugidos, relógios, agouros.

 

O fogo dos ventos soprando do norte,

a noite azulada tangendo os abismos.

Na dança da flecha se vão os aforismos:

paisagens, caminhos, sertões, um galope.

 

Lonjuras, espinhos, mais um retirante;

que pasme a cidade ante o vôo do condor

e a orquestra afinada dos ventos uivantes

 

no entulho da morte dos sonhos de amor.

Não morro no inferno traçado por Dante

porque codifico a loucura que sou.

 

 

 

 

DESENCUENTRO

 

Hay

una puerta abierta

en cuya casa

vive

un poeta

hambriento de amor

 

Hay

una estrella

buscando abrigo

en mi corazón

sin saber

a donde estoy

 

 

 

 

REQUERIMENTO

 

Do céu das restingas

de todas tangentes

do azul do vulcão

a sombra se move

à prova dos nove:

festim de ilusão.

 

A aurora das vidas

a lira da fauna

as pernas da flora

veredas, caatingas

cometas respingam

nos olhos do não.

 

No véu das astúcias

roubaram as Minas

do rei Salomão;

e a quem interessa

o sopro da sina

do meu coração?

 

 

 

 

CANTO LÍRICO DE UM SERTANEJO

 

Sou do seio das catingas

lá das bandas do sertão

carrego na veia a essência

dos acordes do azulão

do açum preto o sustenido

da cigarra o alarido

da coruja a solidão.

 

Sou o Pajé lá da floresta

o Xamã buscando a cura

de toda ferida aberta

da mais profunda loucura

sonho eterno de menino

eu sou o badalar do sino 

e o doce da rapadura.

 

Bode deserto no pasto

apartado do rebanho

Asa Branca em retirada

cobra que não tem tamanho

o tatu-bola escondido

um lobisomem sofrido

assanhaço sem assanho.

 

Sou caipira itinerante

águas velozes do rio

bem-te-vi anunciando

que andorinha está no cio

o verão queimando a mata

um cachorro vira-lata

todas as noites de frio.

 

Galo da crista vermelha

no seu despertar da aurora

berro do garrote magro

que o verão então devora

canário longe do ninho

voando sempre sozinho

desde as lonjuras de outrora.

 

Urubu buscando a presa

papagaio falador

gavião beijando as nuvens

inocente beija-flor

sou preguiça descansando

nessa estrada passeando

sem inveja do condor.

 

Galope incansável sou

do meu cavalo alazão

gozando da liberdade

indiferente à razão

que vai tangendo a boiada

numa longa caminhada

nos capinzais do sertão.

 

Todo sol de primavera

com seus raios de esperança

colorindo a nostalgia

esturricando a lembrança

incendiando o amanhã

das aves de ‘arribaçã’ 

e do meu sonhar-criança.

 

Eu sou o arrebol primeiro

com a corneta da alegria

convocando a passarada

a mais uma sinfonia

sou também o entardecer

todo o escarlate-morrer

vestido de poesia.

 

Sou o amor dos inocentes

o vento abrindo janela

soprando nos meus ouvidos

que vai chegar Cinderela

promessas de uma princesa:

la belle de jour surpresa 

que ainda espero por ela.

 

Sou a sanfona do “Lua”

pondo estrelas a dançar

espada de Virgulino

querendo sangue inventar

Conselheiro na idéia

coisas do arco da “véia”

tentando me alucinar.

 

Sou a imensidão do açude

suas águas cristalinas

lágrimas desatinadas

escorrendo nas colinas

todo o frio das invernadas

a solidão das manadas

as serpentes assassinas.

 

Picula, bumba-meu-boi

dança de roda ao luar

saci-pererê no mato

sou vaga-lume a piscar

cobra cega vendo tudo

sou caipira e não me iludo

colorindo meu sonhar.

 

Sonhar de pombo-correio

levando cartas de amor

atravessando caatingas

no seu singelo labor

fugindo lá das montanhas

realizando façanhas

com destino a Salvador.

 

Umbuzeiro solitário

contando estrelas no céu

mandacaru sem espinhos

a coivara em fogaréu

um tição de fogo aceso

e este mundo todo preso

debaixo do meu chapéu.

 

Sou o abôio dos vaqueiros

pelos ventos da alegria

nessa estrada empoeirada

seja noite, ou luz do dia

eu sou o berro da manadas

as estrelas prateadas

a viola e a cantoria.

 

O cantar de um menestrel

a flauta de Pan chorando

a gaita com seu lamento

a primavera chegando

o canto do bacurau

o Sítio do Pica-Pau

em meus sonhos habitando.

 

Sou o mistério luminoso

do pequeno vaga-lume

brincadeira de cometas

das rosas todo o perfume

sou a solidão das rochas

o fogo aceso das tochas

das noites todo o negrume.

 

As vestes das nuvens brancas

traduzindo calmaria

derretendo-se no solo

e arejando a escadaria

da igreja de Santa Bárbara

e das ruas de Pasárgada

para me dar moradia.

 

Cavaleiro, anjo de luz

nesse abrir-fechar porteira

explorando meu sertão

com bravura e brincadeira

mas logo se alguém se atreve

lanço fogo, água e neve

saco da espada guerreira.

 

Eu sou menino-ancião

porta aberta pro mistério

magia de Salomão

matuto falando sério

um compulsivo do estudo

querendo saber de tudo

mas às vezes sem critério.

 

Rodas do carro-de-boi

nas estradas do sem fim

com seu gemido sem cura

acenando adeus pra mim

apagando da memória

a doce infância de glória

desse louco querubim.

 

Eu sou uma casinha branca

cercada pela alegria

encoberta de esperança

que o futuro já anuncia

o chegar da primavera

e também da Nova Era

na mais perfeita harmonia.

 

Sou o breu que banha a noite

de suspense e de mistério

segredos da madrugada

silêncio do monastério

alarido dos pardais

a dança dos bambuzais

no tablado do etéreo.

 

Meu avô tirando leite

na vaquinha holandesa

canarinho na cancela

com seu canto de surpresa

minha avó fazendo renda

minha mãe com sua prenda

colorindo a farta mesa.

 

Minhas irmãs no varal

meus irmãos lá no roçado

abraçados à enxada

e também puxando arado

semeando seu sustento

desprovidos de lamento 

tendo a sorte do seu lado.

 

Do jacarandá eu sou

fortaleza e solidão

sonho que desaparece

na iminência da extinção

ante o corte do machado

e a ganância do mercado

dessa industrialização.

 

Eu sou o acre do limão

laranja que nunca acaba

o gosto do tamarindo

o mel da jabuticaba

o maracujá açu

a castanha do caju

e o gostinho da goiaba.

 

Do jasmim sou todo aroma

do canavial o mel

da gaiola o passarinho

o esperar Papai Noel

o pavão e sua beleza

o verde da Natureza

o Maestro e seu pincel.

 

Mas o tempo em disparada

não me espera lá na esquina

quando do meu sonho acordo

minha vida então declina

e noutra realidade

solitário na cidade

vou cumprindo minha sina.

 

O trem que me conduziu

diluiu-se na estação

não há passagem de volta

pra retornar ao sertão.

Sem asas para voar

sem sonhos para sonhar

vou seguindo essa missão.

 

E na selva de cimento

já não sou anjo de luz

junto aos animais falantes

eu vou carregando a cruz.

Sou mais um na multidão

perdido na contramão:

o destino me conduz.

 

Mas não me entrego porque

sertanejo é mais que forte

é raio rasgando o céu

muito mais que o vento-norte

semente de luz plantada

todo desafio da estrada

de quem nunca teme a morte...

 

FIM

 

 

 

BIOGRAFIA

  

Antonio Carlos de Oliveira Barreto, natural de Santa Bárbara-Bahia, professor (com 18 anos de experiência em sala de aula), poeta e cordelista. Graduado em Letras Vernáculas e pós-graduado em Psicopedagogia e Literatura Brasileira.

 

Vários trabalhos em jornais, revistas e antologias, tendo publicado 53 folhetos de cordel que abordam temas ligados à Educação, problemas sociais, futebol, humor – além de 15 títulos ainda inéditos.

 

Seu terceiro livro de poemas, Flores de umburana, foi publicado em dezembro de 2006 pelo Selo Letras da Bahia. Ultimamente Antonio Barreto vem se dedicando à cantoria e ministrando palestras e oficinas de cordel em escolas públicas, particulares, faculdades e outras instituições.

 

Títulos de cordel já publicados:

 

1 – O discurso de um caipira arretado.

2 – A história do leão que endoideceu a população de Santa Bárbara.

3 – A origem do Mensalão vem dos tempos de Cabral.

4 – O Bahia e o Vitória na 2ª divisão.

5 – O Bahia e o Vitória na 3ª divisão.

6 – O Bahia e o Vitória na língua de dois torcedores apaixonados.

7 – O Colo-Colo faz festa no Barradão.

8 – A Seleção Brasileira deu vexame na Alemanha.

9 – Romário encerra a carreira causando decepção.

10 – A peleja internética entre dois cabras da peste. C/Jotacê Freitas.( 1ª peleja pela internet que se tem notícia ).

11 – O bate-papo virtual entre Feira e Santa Bárbara. C/Franklin Maxado.

12 – A peleja de Antonio Barreto com Carlos Joel.

13 – A carta de um matuto baiano a George Bush.

14 – A peleja de Raul Seixas com Zé Limeira no avarandado da lua.

15 – A história do aluno preguiçoso que não gostava de estudar.

16 – Uma experiência de cordel na sala de aula.

17– Aula de Barroco em cordel.

18 – A consciência ecológica que os nosso filhos precisam ter.

19 – O eleitor que trocou Geraldo Alkmim por um walkman.

20 – O Matuto que fez uma promessa para Santo Antonio.

21 – Canto lírico de um sertanejo.

22 – O passarinho que foi aprisionado na cidade grande.

23 – Um galope à Beira Mar nas asas da modernagem.

24 – Padre Pinto está correto ou merece punição?

25 – O feirense João Falcão que conheci.

26 – O professor Gilfrancisco no imaginário popular.

27– As aventuras de Bin Laden no carnaval da Bahia.

28 – Diário de um fumante estressado.

29 – Mentiras que o povo gosta em época de eleição.

30 – Clodovil está correto ou merece punição.

31 – O sertão é o meu lugar.

32 – A operação Navalha no reino da impunidade.

33 – Carta de um professor baiano ao governador Jaques Wagner.

34 – O encontro de Marinês com Luis Gonzaga no avarandado do céu.

35 – Detalhes da escravidão em Casa Grande & Senzala.

36 – ACM está correto ou merece punição?

37 – Reflexões pedagógicas nas trilhas de Alicia Fernández

38 – A história de um aluno portador de TDA/H

39 – O patinho feio nas ondas da Internet

40 – O aluno que não queria crescer.

41 – A peleja internética de uma mulher arretada com dois cabras da peste.  C/        Jotacê Freitas e Gilmara Cláudia Silva. (1ª peleja a três que se tem notícia).

42 – Um olhar crítico sobre a guerra de Canudos.

43 – Despedida e tragédia nos Estádio da Fonte Nova.

44 – Meu Corinthians abraçou a Segunda Divisão.

45 – Discutindo a Lei 10.639 na sala de aula.

46 – O valor da Arte na Educação.

47 – Carta de um professor baiano ao presidente Lula pedindo a inclusão do     Cordel na sala de aula.

48 – ABC do HIV

49 – O rapaz que trocou a namorada pela sogra.

50 – A peleja de uma mulher arretada com um cabra cismado. ( c/ Creusa Meira)

51– A peleja da Internet com a Sabedoria

52 – As aventuras de Zé Parabala no sertão de Santa Bárbara.

53 – Um político exemplar chamado Francisco Pinto.

 

Contatos: acobar@bol.com.br

 

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