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Nicolau Saião, O bosque encantado

 

POEMAS DE ALAIN GRANDBOIS

 

 

QUE A NOITE SEJA PERFEITA...

 

Que a noite seja perfeita se formos dignos dela

Nenhuma pedra branca nos indicava o caminho

Onde as fraquezas vencidas acabavam de morrer

 

Íamos para além dos mais longínquos horizontes

Com os nossos ombros e com as nossas mãos

E esse entusiasmo tamanho

Até ao brilho das abóbadas insondáveis

E essa fome de permanecer

E essa sede de sofrer

Sufocando-nos a garganta

Como mil enforcamentos

 

Partilhámos as nossas sombras

Mais do que as nossas luzes

Mostrámo-nos

Mais gloriosos com as nossas feridas

Do que com as vitórias esparsas

E as manhãs felizes

 

Construímos muro a muro

A negra muralha de nossas solidões

E essas cadeias de ferro prendendo o nosso andar

Forjadas com o mais duro metal

 

Que perfeita seja a noite em que nos afundamos

Destruímos toda a felicidade e toda a ternura

E os nossos gritos não terão

Doravante mais do que o trémulo eco

Das poeiras perdidas

Nos abismos do nada.

 

(in Poèmes d’ Hankéou, 1934)

 

 

 

PRESO E PROTEGIDO

 

Preso e protegido e condenado pelo mar

Flutuo no vácuo das ondas

As colunas do céu carregam os meus ombros

Os meus olhos fechados rejeitam o arcanjo azul

O peso das profundezas estremece sobre mim

Estou só e nu

Sou só e sal

Flutuo à deriva sobre o mar

Ouço a aspiração gigante dos deuses imersos

Escuto os derradeiros silêncios

Para além dos horizontes mortos

 

(in Les Iles de la Nuit, 1944)

 

 

 

A ALVA AMORTALHADA

 

Mais baixo ainda meu amor calemo-nos

Este fruto aberto ao sol

Os teus olhos como o sopro d’ aurora

Como o sal das sarças reveladoras

 

Calemo-nos calemo-nos há em qualquer lado

Um coração que chora sobre um coração

Pela última aventura

Pelo tumulto total

 

Calemo-nos nada pode recomeçar

Esqueçamos as lâmpadas as horas sagradas

Esqueçamos os fogos-fátuos do dia

O nosso prazer nos arruína

 

Mais baixo ainda meu amor

Ah mais baixo meu querido amor

Estas coisas devem murmurar-se

Como entre dois moribundos

 

Logo deixaremos de querer distinguir

A franja de rugas nos nossos rostos

Ah olhemos o cintilar das estrelas

Mesmo no segredo de nossos dedos

 

Fitemos tudo o que recusa

O ouro destruído da lembrança

O belo quarto de outros tempos

E seus braços de faíscas surdas

 

Calemo-nos esqueçamos tudo

Afoguemos as palavras mágicas

Preparemos as nossas ternas cinzas

Para o grande silêncio inexorável

 

(in Rivages de l’ Homme, 1948)

 

(Traduções de Ruy Ventura)

 

 

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