Três poemas de Ramón López
Velarde
POBREZINHA
SONÂMBULA...
A Pedro de Alba
Com
planta imponderável
cruzas o mundo e a minha consciência,
e é teu sofrido rosto como um êxtase
que se dilata numa transparência.
Pobrezinha sonâmbula!
Pareces, nessa ronda de noviça,
ir dizendo ao altar: “Oh, não me danes;
temo que me maltrate uma carícia.”
Devolves seu matiz imaculado
à ilusória paisagem onde pousas,
e aos homens restituis integridade,
tão inocente, e a restituis às coisas.
Assim cruzas o mundo
com ingrávidos pés, e em transparência
de êxtase se adelgaça o teu perfil,
e vais dizendo: “Marcho na clemência,
do panorama eu sou a virgindade
e a embriaguez clara de tua consciência.”
DOMINGOS DE
PROVÍNCIA
Aos domingos, no meu povoado é de costume
que descubram na Praça as garbosas cabeças
as moças, e há nos seus olhos um doce lume,
e dá no quiosque a banda umas lânguidas peças.
E, ao cair sobre a aldeia a noite sonhadora,
cada amante exercita o seu melhor olhar,
e a orquestra no violino e na flauta entesoura
mil românticos sons na noite a festejar.
Os dias de guardar regalam aos viajantes,
nesses longes rincões, gratos amanheceres
em que, o Lavalle em punho e frescos os
semblantes,
cada moça gentil para a igreja dispara;
que nos dias de festa, entre aquelas mulheres,
não ficará sem missa uma só bela cara.
OFERENDA ROMÂNTICA
Fuensanta: essas finezas mil do Amado,
os mais finos carinhos,
hão de ser para ti minguada coisa,
porque te honrar é que resulta honrado.
A coroa de espinhos,
em levando-a por ti, é suave rosa
que aromatiza a têmpora do Amado.
O madeiro pesado
em que pereço pelo teu amor
não pesa mais, Fuensanta,
do que o arbusto em que canta
teu amigo e cantor,
o rouxinol, e que com uma só mão
arranca facilmente o lenhador.
Por ti estar enfermo é já estar são,
todos os contos para ti são nada
que na remota infância
divertem o mortal;
porque cheiras melhor do que a fragrância
por jardins encantados derramada,
e porque és tão mais diáfana, bem meu,
que o diáfano palácio de cristal.
Mas, sendo tal o poderio teu,
permite oferecer-te esta oblação
do velho parque do meu coração.
Está em dezembro, mas com o teu cântico
terá as rosas de um abril romântico.
Bela Fuensanta,
tu já bem sabes o segredo: canta!
(Traduções de
Renato Suttana)
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