Poemas
de Orlando Neves
POEMA
A
mão imóvel. A luz que me contempla.
É
fora de mim que alguém está vivendo.
A
duras penas, a mão move-se. Busca
a
palavra que sei oculta na página branca.
Mas
nem a luz a desenha. A que parte
Irei
com o pensamento, se a mão não obedece?
Já
o tempo me adoeceu neste tão pouco
que
o cérebro dura. A noite é sempre.
Com
a palavra que morre, morrem
os
meus monstros. Que sombras interrogo
se
nenhuma resposta ouço? O quarto é desabrido,
nada
ressuscita da memória. A dor
deixa
escombros. Nem o fogo lhes dará cor.
POEMA
Procurei-me
entre as ervas ásperas do inverno
que,
nuas, iluminaram o silêncio.
Assim
foi que me disseram. Procurei-me entre
os
figos das colinas, lendo no seu álcool
o
tempo gerado pelo límpido orvalho.
Assim
foi que me disseram. Procurei-me entre
os
outros para encontrar no corpo a mansidão,
passagem
e tributo a uma morte calma.
Assim
foi que me disseram. Procurei-me entre
a
vastidão das águas – o claro caminho
em
que a dor seria um areal de alegria
fugaz.
Procurei-me entre as palavras do mundo.
Assim
foi que me disseram do calamento
da
doce melodia das fontes à noite.
(in
Diário de estar e ser)
|