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CODORNIZES
À FIALHO DE ALMEIDA, UM REQUINTE
(Nuno
Rebocho)
Tempos
houve em que os literatos se faziam honras de cozinheiros. Dos
melhores. Tão excelentes nas lides das letras como nas da gamela. O
bom do Fialho de Almeida, se louvava o país das uvas, tinha também
artes de culinária que ainda hoje deslumbram tanto como o esplendor
da prosa. Disso tive prova em Alvito, em casa de amigos, onde
arribei para janta. Reservaram-me um pitéu: codornizes à Fialho de
Almeida. Banzaram-me!
Eu
digo-vos. Ficaram as avezitas a marinar de um dia para o outro, em
marinada heróica: em vinho, alecrim e rosmaninho, azeitona descaroçada.
Mas antes de banharem nesta calda, os bichos tiveram trato. Bem
esfregadas de alho, sal e pimenta e um tudo muito nada de canela
(sem abuso, apenas para lhe dar o cheiro). Chegado o momento de ir
à frigideira de barro, as codornizes foram retiradas da marinada,
enxugadas num pano, que deveriam seguir secas à vida.
Que essa era a regra antes do assalto final: na frigideira,
aqueceram um palmo de azeite, a que lhe acrescentaram uma colher de
banha e aí aloiraram alho, para mitigarem a gorduranca com uma
colher de sopa de vinho do porto. E foi neste requinte que as
codornizes fritaram!
Retiradas
para a travessa as codornizes, aproveitaram os despojos da fritada
para cozerem a marinada na frigideira: o molho com o qual as
codornizes foram regadas. Divino! O senhor Fialho de Almeida tinha
arte. Se duvidam, ensaiem. Em verdade vos digo que não sei o que
mais adorar: se a truculência azorragante de “Os Gatos”, se a
excelência do manjar. E fiquei grato a esses amigos de Alvito.
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