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Nicolau Saião, Os campos da infância 1 (painel para azulejos)

 

NOITES DO CASTELO

[Sobre Visita do Fantasma na Noite] (*)

 

(Mauro Mendes)

 

A Renato Suttana

 

“Oh! Meu Deus! Eu poderia ficar confinado numa casca de noz e, mesmo assim, considerar-me-ia rei do espaço infinito, não fossem os maus sonhos que tenho!”

(Shakespeare, Hamlet, Ato Segundo, Cena II)

 

Quem é que passa, com andar de vento,

pelas ameias do castelo,

a perturbar o sono dos vigias?

Quem é que cinge a espada

e de elmo e couraça se atavia,

a despertar a sede de batalhas?

Tudo é silêncio e, no entanto, o inimigo

é mais que o pensamento e seus desvãos.

Lá longe, muito além da bruma

que encobre a cidadela,

hordas invisíveis se acantonam,

cheias de estranha vilania...

 

... E o vento traz tristes cantigas,

que se espalham pelos campos,

assustando o pegureiro e sua grei:

 

– Em Roncesvalles,

ao pôr-do-sol,

guerreiros aos milhares,

muitos guerreiros de escol,

passados ao fio da espada!

 

... E ninguém vem avisar ao nosso rei?

 

Dentro da escuridão da noite,

o castelo é sua própria sombra,

sobre si mesmo escorrendo,

como de um grande almofariz,

mas é possível enxergar, no silêncio,

cada contorno seu,

pois há brilhos fugitivos, ardendo

como fragmentos de sol...

 

... E o vento traz lúgubres cantigas,

que atravessam os campos,

assustando o pegureiro e sua grei:

 

– Em Roncesvalles,

ao pôr-do-sol,

guerreiros aos milhares,

muitos guerreiros de escol,

(Rolando exangue)

passados ao fio da espada,

o riacho virou sangue!

 

... E ninguém vem avisar ao nosso rei?

 

Solitários como um osso,

os monstros dormem no fosso,

mas, de suas fauces, escorrem

estas águas negras, enormes,

que, ao redor do castelo, correm,

como em torno a um velho cais...

 

... E o vento já não traz canções antigas...

 

Livre da sombra da visão,

o castelo é, agora,

uma memória pobre

da névoa que a idéia encobre.

Soa, enfim, a corneta!

Chamem os arqueiros!

Baixem a ponte levadiça!

Os mensageiros vêm vindo,

em palafréns de sonho...

Acordem o rei,

(cúmplice dos seus desvarios)

acordem o rei,

mas, sobretudo,

acordem os monstros do fosso!

 

 

 

(*) Renato Suttana. Visita do Fantasma na Noite. Guarapuava: Edição do Autor, 2002.

 

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