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Nicolau Saião

 

DOIS POEMAS

 

(Geraldo Maia)

 

 

GERAÇÃO DE MARÇO

(Quase um hino)

 

 

Nós somos a geração de março

trazemos vendas nos passos

e fechaduras solitárias nos olhos

 

Nós somos a geração de agora

Não sabemos o dia em que estamos

a mercê de nossa demora

 

Nós somos a geração híbrida

(de laboratório)

Vivemos nos corredores

entre horários afiados

e o descanso das sepulturas

 

Nós somos a geração estúpida

Ficamos sempre em dívida

com a nossa dúvida

e não contestamos

 

Brigamos nas mesas dos bares

as boas notas tiradas

nas aulas de covardia

 

Nós somos a geração sem voz

Sem olhos

e sem história

 

Somos cordeiros dopados

Somos o consenso do medo

Somos o corte do grito

Somos o som do arbítrio

Somos o quadro-frio do "NÃO"

A gravidez prolongada

da exceção

 

Somos sócios da indiferença

Somos a chave da violência

Somos as peças dos tecnocratas

Somos as cordas da repressão

A partilha hereditária

da corrupção

 

Nós soms fabricados em série

nas escolas e universidades

e vendidos no mercado

ao preço da usura

 

Somos sim funcionários da tortura

frutos do absurdo

que são todas as ditaduras

 

Nós somos uma geração de culpados

e ainda seremos culpados

pela próxima geração

 

se consentirmos ser

enquanto trocam os termos

que a liberdade nunca ditou

 

se consentirmos estar

ao lado do corpo abatido

naturalmente

como o corpo abatido

 

Somos culpados em máxima culpa

porque maximizamos as desculpas

e minimizamos fazer!

 

Nós somos a geração castrada

comemos "pão-com-cocada"

"rotidoguicumustarda"

fumamos a "palha da braba"

cheiramos o "pó das estradas"

nas reuniões marrr giiii naaaaiiiisssss...

 

Nós somos a raiz do mal

o radical doente

mas

 

apesar em nós

essa loucura

somos de repente

                A CURA!

                   A CURA!

                     A CURA!

                             (oxénte!)

 

(Rio de Janeiro, PUC, 1978)

 

 

 

 

CORDEL DA MEMÓRIA POLÍTICA

Desde que o mundo é mundo
Um bando de vagabundo
Adora meter a mão
Em tudo que é alheio
De geração a geração
É um vício muito feio

Roubar é o que dá prazer
Pra essa corja de ladrão
E não venham me dizer
Que é só de ocasião
Desde antes de Cristo
De há muito se tem visto

Essa súcia rapinar
Aqui em nosso país
A tropa criou raiz
No ofício de roubar
Primeiro foi Portugal
Trazendo a turma do mal

Já escolada no vício
Depois toda a Europa
Também mandou sua tropa
Seu bando de estrupício
Os americanos do norte
Mandaram um grupo bem forte

Tudo gangster legítimo
Logo entraram no ritmo
Dos parceiros de roubar
Roubo na ponta do dedo
Se ensinou desde cedo
Fazer aqui como lá

Os índios estupefatos
Assustados com tais fatos
Tentaram daqui expulsar
Quase foram exterminados
Até hoje são roubados
Sem ter a quem apelar

Da África roubaram vidas
Preciosas reduzidas
Ao monstro da escravidão
Hoje roubam até a alma
E a gente perde a calma
Ante tanta espoliação

Mas no governo de Lula
Começou a ser expurgado
O antigo carnegão
É ladrão pra todo lado
Tudo cheio de gula
No vício de meter a mão

O pus da corrupção
Explode pra todo lado
Respinga até no irmão
No juiz e no soldado
No padre e no empresário
O crime não tem horário

Nem classe credo ou cor
Não tem sexo ou profissão
Qualquer um que mete a mão
Não pode gozar de favor
Tem é que receber peia
Mofar numa cadeia

Conforme o juízo da lei
Tanto faz peão ou rei
Criminoso é tudo igual
Pra polícia federal
O tratamento é só um
Prisão simples e comum

Só agora se registra
Tal atitude do governo
Não tem essa de enredo
Nem trela pra vigarista
A ordem é cortar na carne
Seja no todo ou na parte

Mas o bando que mandava
Que há séculos mamava
Nas tetas ricas do povo
Tratam o presidente eleito
Como se só tivesse defeito
Botam cabelo em ovo

Ameaçam até bater
Surrar sem nenhum respeito
Xingaram e pra valer
Nunca um chefe de estado
Foi duramente execrado
Sangrado de todo jeito

Se alguém dava um pum
Foi Lula! Foi Lula! Surra!
Se um estupro ou assalto
Logo gritavam bem alto
É Lula enchendo a burra
Virou um lugar comum

Por a culpa por qualquer
Atentado ou homicídio
Do tráfico ao genocídio
Ou exploração de mulher
Assédio suborno racismo
Todo tipo de abismo

Foi Lula quem cometeu
Se alguém pariu ou morreu
A culpa é toda de Lula
Até de coice de mula
Chegou a ser acusado
Sumariamente julgado

Sem direito de defesa
Foi a mais perfeita vítima
De linchamento moral
Sua vitória legítima
Virou símbolo do mal
Mas um dia com certeza

A verdade será normal
E soará tão intensa
Que Lula terá afinal
A sua maior recompensa
Ver o criminoso real
Pagar por tanta ofensa

Usaram a televisão
Rádio revista e jornal
Foi tanta judiação
Que Lula sentiu-se mal
Armaram uma arapuca
Prepararam uma cumbuca

Cheia de veneno e fel
Chamaram pra um debate
Prometeram até o céu
Mas por trás era o inferno
Comandado por quem late
Todo vestido de terno

Lula percebeu o fosso
Que a carne era só osso
Cartas marcadas de lama
Três candidatos à fama
Às custas de um estadista
A coisa dava na vista

Lula preferiu o povo
Ao vivo juntos na praça
Mas a TV viu desgraça
Não quer Lula de novo
E atacou na ausência
Sem um pingo de decência

Lançou mão da covardia
Com o aval dos candidatos
Que agiram como ratos
Quando o gato está ausente
Pra essa atitude indecente
A imprensa deu garantia

Quis distorcer a verdade
E pra cúmulo de maldade
Despejou tanta mentira
Botou Lula na mira
E atirou chumbo grosso
Mas Deus protege o moço

Que quase foi reeleito
Logo no primeiro turno
O segundo foi o jeito
Que o Criador encontrou
Para mostrar no returno
Que em Lula sempre votou

E pra esclarecer a tramóia
Acabar com a paranóia
Dos que se acham os donos
Perturba-los em seus sonos
Trazer à tona o real
Revelar o bacanal

Mostrar o quanto fez mal
A mutreta do SIVAM
Que ninguém pode ser fã
De suborno em “PASTA ROSA”
Que a jogada do PROER
Dá nojo só de dizer

E a fraude dos PRECATÓRIOS
Urdida nos escritórios
O DNER foi roubado
Um crime tão descarado
Que em vez de “fechar” o ladrão
Fecharam foi o órgão

E teve a COMPRA DE VOTOS
A coisa rolou pelo Acre
Mas logo perdeu o lacre
Espalhou-se como praga
Aos lugares mais remotos
Nem se precisou de draga

Pra revolver a sujeira
Estava tudo explícito
O tamanho do ilícito
Vencia qualquer barreira
Só o governo não via
Se era quem mais queria

A todo custo implantar
A reeleição de FHC
Por que a imprensa não vê?
Não faz o mesmo barulho?
Tudo está por apurar
Ou querem empurrar o bagulho

Malhado garganta abaixo
Do povo que sai de baixo
Não quer mais ser enganado
Como no caso do REAL
Quando foi desvalorizado
Num estelionato eleitoral

E o esquema MARKAFONTECINDAM
A imprensa foi irmã
A câmara foi conivente
Se isso é coisa decente
É ético e honesto
Então sou eu que não presto

E nem você que me lê
Porque pra nós baixaria
Foi a tal PRIVATARIA
Que não dá pra entender
Vender ouro por banana?
A quem pensa que engana

A quadrilha de FHC?
O povo sabe e entende
Dos grampos no BNDES
PÉRSIO ÁRIDA E REZENDE
Nos fazem de Zés Manés
Enquanto FHC se serve

Da lama da privatização
Das falcatruas na SUDAM
Da corrupção na TELEBRÁS
A sua triste gestão
A mais imunda e malsã
Ninguém esquece jamais

Nem mesmo quem foi só bode
O tal do EDUARDO JORGE
No esquema do TRT-SP
Na montagem do CAIXA DOIS
No afã de reeleger
Imagina então depois

Qualquer absurdo é normal
Favorecer a MONTREAL
Acham que é pura ética
O tucanato é liberal
Sua honestidade eclética
Sua conduta patética

Os pedidos de apuração
Iam pro “engavetador-geral”
Os inquéritos instalados
Não eram alardeados
Pela imprensa “oficial”
Pois só tinha “mangangão”

Envolvido em tramóias
Ministros e deputados
Senadores e outras “jóias”
FHC fez sabotagem
Usou de fina malandragem
Cercou por todos os lados

Impediu que se investigasse
Que a polícia botasse
Os criminosos de elite
Na cadeia e se me permite
O próprio presidente
Então o chefe comandante

 

 

 

Resumo Biográfico

 

Geraldo Maia Santos (Geraldo Maia) nasceu em Itabuna (Ba), no dia sete de outubro de 1951. Começou a escrever aos seis anos e ainda se considera um aprendiz repetente da escrita numa sociedade ágrafa com forte ascendência oral. Tem nove livros publicados, seis de poesia (Triste Cantiga de Alguma Terra (esgotado) é seu livro de estréia, em 1978, Kanto de Rua (esgotado) (1986), Em Cantar a Mulher (esgotado) (1996), Sangue e palavra (1998), O chão do meu destino (2000), ÁGUA (2004) (esgotado) e dois de ficção (Atol ou o mar que se perdeu de amor por um farol (esgotado) (1991) e PUNHAL, prosa de cangaceiro (esgotado) (1992). Todos os livros editados de forma independente, exceto Sangue e Palavra, editado pelo Selo Bahia. E um de cordel: "CORDEL DO MENSALÃO". Recebeu menção honrosa no concurso de poesia do Banco Capital em 2004 participando da coletânea, Os Outros Poemas de Que Falei, junto com mais seis poetas. É casado com a artista-plástica e poeta, Márcia Santos, tem três filhos, Pedro Santos, José Flávio Maia Santos e Zag Bertim Maia Santos. Ex aluno de engenharia civil (ufba), jornalismo (puc/rj), é ator, diretor teatral, editor, ambientalista, ecotrofoterapeuta, arte-educador, tendo atuado nos CEUs, em São Paulo, realizando oficinas de poesia e teatro. É um dos fundadores (em janeiro de 1979) do extinto, Movimento Poetas na Praça, que produziu e popularizou a poesia universal através de recitais diários nas praças da cidade, principalmente na Piedade, nas décadas de oitenta e noventa, reunindo os mais ousados, libertários, criativos e revolucionários poetas da Bahia, a exemplo de Zeca de Magalhães, Ametista Nunes, Antonio Short, Miguel Carneiro, Joelsom Meira, Douglas de Almeida, Eduardo Teles (também biógrafo de Castro Alves), Beto Silva, Gilberto Costa, Gilberto Teixeira, Jairo Rodrigues, César Lisboa, Edésio Lima, Semírames Sé, Margareth Castanheiro, Agenor Campos, Dorival Limoeiro (Dori), "Pica-Pau", e tantos outros que a praça acolheu e escolheu para enfrentar e vencer as trevas da ditadura militar mas que estão excluídos como criadores de literatura, momentaneamente, pelas trevas da intolerância (ditadura) acadêmica. Pertence à Escola Baiana de Poesia.

 

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