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Nuno de Matos Duarte

 

Dois poemas de Enrique González Martínez

 

 

LUMES

 

Dos sete lumes de alegria

Que em minha vida têm velado,

No tempo de eu moço e abrasado

Apenas um deles ardia.

De minha infância impaciente

À maturidade advertida,

Foi acendendo-os lentamente

Obscura mão desconhecida.

 

Dos sete lumes de pesar

Que hoje ardem sobre o meu destino,

No meu tempo de pequenino

Só um deles se viu brilhar.

De meu abril fogoso e louco

Ao outono que me intimida,

Foi acendendo-os pouco a pouco

Obscura mão desconhecida.

 

Hoje vejo em meu céu velar

Cada riso ou melancolia

Os sete lumes do pesar,

Os sete lumes da alegria.

 

Mão incógnita que conclamas

À hora fria da partida

E hás de extinguir as puras chamas

Que arderam sobre minha vida:

Não me queiras a luz negar

De um prazer ou melancolia,

Quando meu voo último alçar...

Oh, deixa um lume de alegria!

Oh, deixa um lume de pesar!

 

 

 

INTERIOR

 

Penetrei em minha alma. Parecia

Um templo de cristal sem luz do dia.

Movi em torno um pensamento louco,

Ébrio, buscando o que me pertencia,

E então fui descobrindo-o pouco a pouco.

 

Junto do muro o amor, constante e cego,

Forjava flechas e atiçava o fogo

Que outrora em rubra chama se acendia

E tudo incendiou, mas fez-se logo

Brasa dormente sobre cinza fria.

 

Mais além minha dor, serena e forte,

Sozinha frente ao fantasma da morte,

Se embebia no pranto, que não pude

Levar os olhos, e afinal converte

Covarde imprecação em mármore rude.

 

Minha inquietude no centro da nave

Debatia-se em volta, como uma ave

Que, cega pelo sol, se descaminha

E na angustiante solidão não sabe

Para onde voava nem de onde provinha.

 

Na dúvida mortal, pedi à vida

O lume com que aclare esta partida

Que por mandado fatal eu empreenda.

E ouvi a voz em ecos repetida:

“Será teu coração farol na senda”.

 

E confiei-me à palavra da vida.

 

(Tradução de Renato Suttana)

 

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