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Alberto Lacet

 

A CASA DA ESFINGE

 

(Lord Dunsany)

 

Quando cheguei à Casa da Esfinge já estava escuro. Deram-me ansiosas boas-vindas. E eu, apesar do feito, fiquei contente em escapar daquela ominosa floresta. Vi, de imediato, que ocorrera um feito, embora um manto fizesse tudo o que um manto pode fazer para ocultá-lo. O simples desconforto daquelas boas-vindas fez-me suspeitar desse manto.

 

A Esfinge estava pensativa e silenciosa. Eu não viera bisbilhotar os segredos da Eternidade nem investigar a vida privada da Esfinge, e assim tinha pouco a dizer e poucas perguntas a fazer. Mas ao que quer que eu dissesse ela permaneceu pesadamente indifererente. Estava claro que ela suspeitava que eu estivesse atrás dos segredos de algum de seus deuses, ou em ousada perquirição de seu tráfico com o Tempo, ou então ela estava, sombriamente, absorvida a lucubrar sobre o feito.

 

Logo vi que alguém mais além de mim seria recepcionado. Vi-o pela maneira inquieta como olhavam da porta para o feito e de novo para a porta. E estava claro que a recepção seria com uma porta trancada. Mas que trancas, e que porta! Ferrugem e decadência e fungo tinham se acumulado ali por tempo demais, e não havia mais impedimento que pudesse barrar sequer a passagem de um lobo decidido. E eles pareciam temer algo bem pior do que um lobo.

 

Um pouco mais tarde, consegui perceber, a partir do que diziam, que alguma coisa imperiosa e perturbadora estava à procura da Esfinge, e que alguma coisa que acontecera tornava certa a sua vinda. Pareceu-me que tinham estapeado a Esfinge, para fazê-la sair de sua apatia e orar a um de seus deuses, que ela aninhara na casa do Tempo; mas o seu silêncio pensativo tornara-se invencível, e sua apatia oriental, desde que o feito acontecera. E, quando acharam que não podiam fazê-la rezar, não havia mais nada a fazer senão prestar pequenas e inúteis atenções à fechadura enferrujada da porta, e olhar para o feito e matutar, e até mesmo fingir esperança, e dizer que, afinal, isso talvez não atraísse aquela determinada coisa da floresta, que ninguém nomeava.

 

Pode-se dizer que escolhi uma casa desastrosa, mas não se pensaria assim se eu descrevesse a floresta da qual viera, e eu tinha necessidade de algum canto onde minha mente pudesse descansar de pensar nela.

 

Eu me perguntava insistentemente sobre que tipo de coisa viria da floresta por motivo do feito, e tendo visto a floresta – como tu, gentil leitor, não a viste – tinha a vantagem de saber que qualquer coisa poderia vir. Era inútil perguntar à Esfinge: ela raramente revela coisas, tal como o seu amante, o Tempo (os deuses a imitam), e enquanto seu humor estivesse assim sombrio o amuo era certo. Assim, em silêncio, pus-me a lubrificar a fechadura da porta. E, tão logo viram esse ato simples, ganhei a confiança deles. Não que meu trabalho tivesse qualquer utilidade – poderia ter sido feito muito antes; mas viram que meu interesse se voltara, naquele momento, para aquilo que eles reputavam como vital. Ajuntaram-se à minha volta. Perguntavam-me o que eu pensava da porta, se eu já tinha visto melhor, e se eu já tinha visto pior; e eu lhes falei sobre todas as portas que conhecia, e disse que as portas do batistério em Florença eram portas melhores, e que as produzidas por certa firma de construtores de Londres eram piores. E então lhes perguntei o que é que estava vindo em busca da Esfinge por motivo do feito. E, a princípio, não quiseram dizer, e parei de lubrificar a porta; e então disseram que era o arqui-inquisidor da floresta, que é o investigador e vingador de todas as coisas silvestres; e pelo que me disseram pareceu-me que tal pessoa era muito branca, e que era um tipo de loucura vazia que se abatia sobre um lugar, um tipo de névoa na qual a razão não podia viver; e era o medo de tudo isso que os fazia mexer nervosamente na fechadura daquela porta carcomida; mas com a Esfinge não era tanto medo quanto estrita profecia.

 

A esperança na qual tentavam esperar seguia tal caminho, mas eu não compartilhava dela. Estava claro que a coisa que eles temiam era o corolário do feito – via-se mais pela resignação que se estampava no rosto da Esfinge do que pela triste ansiedade de todos em relação à porta.

 

O vento soprou, e os grandes círios oscilaram, e o óbvio medo que tinham e o silêncio da Esfinge se tornaram mais do que nunca parte da atmosfera; e morcegos voejavam incansáveis na penumbra do vento que abatia os círios.

 

Então, ouviram-se gritos ao longe, depois um pouco mais perto, e alguma coisa estava se aproximando de nós, gargalhando terrivelmente. Às pressas, dei uma pancada na porta que eles guardavam; meu dedo afundou na madeira macia – não havia nenhuma chance de segurá-la. Não havia tempo para observar o seu pânico; pensei na porta dos fundos, pois a floresta era melhor do que aquilo. Apenas a Esfinge estava absolutamente calma, sua profecia fora feita, e ela parecia ter visto o seu destino, de modo que nenhuma novidade podia perturbá-la.

 

Mas por degraus carcomidos de escada e tão velhos quanto o Homem, ao longo das bordas escorregadias do temível abismo, com uma tontura ominosa em meu coração e um sentimento de horror nas plantas dos meus pés, resvalei de torre em torre até que encontrei a porta que procurava. E ela se abriu para um dos galhos mais altos de um enorme e sombrio pinheiro, ao longo do qual desci até o chão da floresta. E alegrei-me de estar de volta à floresta de onde havia fugido.

 

E a Esfinge, na sua casa ameaçada – não sei como ela se saiu: se ficou, para sempre, olhando desconsolada para o feito, lembrando-se apenas, em sua mente perturbada, para a qual os garotos agora fazem caretas, de que uma vez ela conheceu bem essas coisas diante das quais o homem se sente perplexo; ou se no final ela escapuliu e, tropeçando horrivelmente de abismo em abismo, topou finalmente com coisas mais altas, e é ainda sábia e eterna. Pois da loucura quem sabe se é divina ou se vem das profundas?

 

 

(Traduzido por Renato Suttana)

 

 

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