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Pablo Picasso

 

PÁSCOA

 

(Nicolau Saião)

 

1.Vem dos tempos antigos a voz desse tempo – antigos para mim, do meu tempo e não da História: era eu que levava ao forno da padaria do sr.Júlio que fumava de boquilha e tinha um dente de ouro (padeiro fino, não sei se me entendem) as latas com os bolos-fintos e as "enxovalhadas" ou boleimas que a Mãe e a Mana artilhavam com saberes de magas.

 

Eu não sabia que era feliz. Só sabia que naqueles dias, naquele tempo de férias da escola, me davam amêndoas, me davam bolinhos doces, me davam alegrias, e o Pai até umas suaves moedinhas...

 

Eu não sabia que era feliz – e na sexta-feira às 3 da tarde soava o apito da fábrica e isso assinalava que alguém, há muito tempo, morrera de morte triste numa terra do Oriente. E sentia-se um estranho silêncio enquanto o apito soava. E eu sentia um frémito porque eu gostava desse alguém que há muito tempo morrera – sem me preocupar se ele era isto ou aquilo.

 

Era um estremecimento, digamos um abraço solidário que ia de mim para ele, porque eu era criança. Ou seja: tinha tantos séculos!

 

E não sabia, nessa altura, muitas coisas – só um poucochinho, um poucochinho mais do que sei hoje.

 

 

2. Ao longe a serra, ao longe como os tempos que passaram. Tempos de páscoa, serras de páscoa, recordações de momentos que depois preencheriam dias e lembranças.

 

Amêndoas, bolos desta terra e daquela, festarolas tradicionais? Sim, isso tudo. E o mais que a emoção dá, que é ir-se vivendo com um resto de inocência e de fraternidade vital. Dentro de nós, fora de nós: para nós e para os outros – que também tiveram/terão seu tempo de maravilhamento.

 

 

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